quinta-feira, 10 de março de 2011

MAIS QUE PAPANGUS, UM AUTÊNTICO CARNAVAL DE PERNAMBUCO


Fui a Bezerros no domingo, dia 6 de março, para ver, mais uma vez, o desfile dos Papangus. A exemplo do ano passado, lá encontrei mais que grupos de Papangus, mas, um foco de resistência cultural diante da ofensiva contra o carnaval de raiz, que se disfarça de Carnaval multi-cultural.

Em Bezerros tive contato com o carnaval de orquestras no chão, do Maracatu, do Caboclinhos, do samba, da Troça irreverente, de muita brincadeira saudável, como deve ser o carnaval de Pernambuco. Bezerros ainda produz um carnaval cuja estrela é o folião. E é o carnaval do frevo-de-rua rasgado pelos metais, da batucada de samba que nos arrasta, do maracatu que nos remete a uma viagem histórica. Em Bezerros vi um carnaval que desmente os inimigos do frevo, que vivem viciando a juventude em coisas de má qualidade. Vi jovens, meninas e meninos, alegres, bonitos, fantasiados ou de corpo pintado, numa participação que parecia querer gritar ao mundo: “Se nos derem este carnaval, nós vamos brincar e vamos gostar”.

Não consigo entender como se apelida de Carnaval multi-cultural um evento com Odair José, Joelma e Chimbinha, Marina Lima, etc., por mais que respeitemos a todos como artistas e reconheçamos o valor de cada um. Ao carnaval de Recife bastava, com certeza, as orquestras de Frevo, os Blocos, as troças, maracatus, afoxés, caboclinhos, nossos cantores e os de fora que gostam e cantam carnaval (Fafá de Belém, Beth Carvalho, etc.) e o resto o povo faz.

Sei que os “de plantão” vão jogar um trem de críticas ao meu pensamento, mas é assim que vejo o carnaval de Pernambuco. Multi-cultural, sim, porque agrega e congrega o frevo, o samba, o maracatu, o afoxé, o caboclinhos, etc., jamais essa mistura que descaracteriza nosso carnaval. Sem preconceitos contra a arte e os artistas, mas, a favor da preservação do carnaval de Pernambuco como bem cultural. No mais, a cidade estava belíssima, bem iluminada e os pólos lotados de foliões de todas as idades.

Voltando a Bezerros, ali encontrei, além do carnaval produzido e brincado pelo povo, uma cidade preparada para o carnaval, com ruas e casas enfeitadas, um povo receptivo, com um enorme sorriso estampado nas faces, uma cidade, enfim, no clima do carnaval, preparada para brincar.

Aqui, na querida Cabo de Santo Agostinho, terra que um dia Pinzón pisou, uma cidade escura, sem enfeites, sem folia, quase não nos deixou saber que era carnaval, com exceção, claro, das nossas pobres e bravas agremiações que, ainda que paupérrimas, conseguem romper a barreira dos descasos e tomam as ruas da cidade, coitadas, numa alegria triste, que mais causa admiração pela pobreza e desarrumação, do que pela beleza do desfile. Destaque mesmo para o abuso dos motoqueiros, para quem não existem normas e nem lei. Tudo podem e tudo fazem.

Em tempo: discordo de um amigo que falou que o carnaval do Cabo de Santo Agostinho agoniza. Morreu mesmo. Na verdade, “descansou”, vítima de uma doença que teve início há mais de vinte anos e se agravou nos últimos sete anos.


*Antonino Oliveira Júnior é da Academia Cabense de Letras, autor do Estatuto do Folião, do Frevo-de-Rua Centenário do Frevo, foi um dos diretores e desfilante da Escola de Samba D.Pedro I, ajudou a fundar e desfilou, na década de 70, na Escola de |Samba Boi Kagado, do GRECUEC) fundador do Bloco Anárquico Deixa Chiar (1983), do Bloco Infantil Pinto da Madrugada (1989), desfilou vários anos no Lira da Mocidade e que, em 1984, puxou o carnaval da cidade, de dentro das sedes sociais para a rua e instituiu a eleição direta para Rei e Rainha do carnaval. Enfim, um cara que gosta de carnaval. Só.

Um comentário:

  1. Antonino, o Carnaval, imagino, como tudo na vida, se transforma. Lembra do Corso na Conde da Boa Vista? Houve, parece, uma tentativa de resgate. Mas a questão é que tudo hoje é muito grande. São mega shows, mega produções, mega tudo. Não tenho em mente qual o modelo de carnaval que deveríamos ter. Aliás, eu nem brinco carnaval. Seja qual for o modelo, que seja um que preserve a nossa cultura, como você tão bem defende.

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