quinta-feira, 12 de agosto de 2010

DEPRESSÃO



Antonino Oliveira Júnior*

Há cerca de dois anos, falei que o Cabo de Santo Agostinho estava à beira de entrar numa depressão cultural. Fui criticado e alvo do bombardeio dos apaixonados pelo governo municipal. Calei diante das insinuações e das ironias e constituí o tempo como meu advogado. Hoje, o quadro está claro e não existem mais dúvidas e nem previsão. A cidade vive um grave momento de depressão cultural e o talento de tanta gente que escreve, pinta, interpreta, que canta, etc., morre no nascedouro por falta de ressonância. O artista cria, vai às ruas com a mente brilhando, mas, por estar numa cidade que não tem políticas públicas de cultura, perde o ânimo e desiste. Vem a frustração e o abatimento. E isto é um quadro típico de depressão.

Sem condenar os poucos que são abençoados pelo tesouro municipal, até porque são artistas e produtores com talento reconhecido, não podemos, no entanto, ficar omissos diante de uma situação em que a cultura é relegada a um “quase” abandono. O orçamento da cultura é muito pequeno, como todos os outros governos, mas, o quadro se agrava pela falta de sensibilidade e de entendimento de quem governa o município, que, em momento algum demonstrou a mínima vontade de tratar a cultura com o respeito e o cuidado que ela merece.

No Cabo de Santo Agostinho, infelizmente, ainda prevalece aquela “máxima”: “Vamos atender, porque esse pessoal é da gente”, como se artista fosse gado ou animal de estimação. Passaram-se quatro anos de letargia, anos angustiantes até para os que, uma vez integrando a máquina, não tiveram forças para formar um cenário diferente. Basta ver a Semana Cabense de Cultura, realizada a partir do esforço de alguns abnegados da Secretaria de Cultura, mas desprestigiada e esvaziada pelo próprio governo.

Na transição do primeiro para o mandato atual, esperavam-se modificações em relação ao comportamento com a cultura. Ou mudando nomes ou posturas. Ou, ainda, os dois. Mas, tudo foi mantido, como se tudo estivesse bem. E reconheço a capacidade de alguns dos servidores da Secretaria de Cultura. Mas, o problema, diferentemente do buraco, não é mais embaixo, é mais em cima.

É preciso repensar a cidade a partir da sua cultura. Os produtores, os artistas, os intelectuais, devem à cidade uma tomada de atitude em defesa da sua identidade cultural de forma independente, à luz da inteligência e do compromisso com a verdadeira riqueza do Cabo de Santo Agostinho. Mais do que urgente, é necessário uma reflexão acerca da situação da cultura no município, objetivando a formatação de uma política pública de cultura, evitando, assim, que vivamos numa cidade tão pobre que só tenha dinheiro.

Sem zelarmos pela manutenção de nossa identidade cultural, deixaremos de ser povo, para sermos, tão somente, um amontoado de gente. Povo sem identidade cultural é povo sem rosto, sem norte e sem rumo, que se perde na ida e na vinda. Perde a consciência e se deixa manipular.

*Antonino Oliveira Júnior é membro da Academia Cabense de Letras.

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