domingo, 17 de abril de 2011

NAS ENTRELINHAS DA ESMOLA

Pr. Adriel Henrique

Certo dia foi oferecido a uma pessoa que não vem usufruindo dos direitos da sua cidadania, uma atividade que lhe renderia como recompensa uma gratificação de R$ 15,00 (quinze reais). A atividade era simples e requeria pouco tempo. Porém a pessoa recusou. Ela se justificou dizendo que, mesmo parada, sem fazer nada, apenas pedindo esmola, ela ganhava muito mais.

O episódio citado lembra a música “Vozes da Seca” de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Esta música fala dos efeitos negativos que as ausências (água, comida, cidadania, emprego) podem provocar na vida de um cidadão. A canção diz que a esmola pode ser prejudicial. Pois assim diz a letra: “Mas doutô uma esmola a um homem qui é são ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão.”

Penso que a primeira etapa da esmola seja sim a vergonha. Primeiro porque tenho visto os constrangimentos de algumas pessoas durante esta prática. E segundo porque muitas vezes ela não é praticada como o evangelho instrui, ou seja, com descrição e livre de interesses (Mt 6.2-4). Passada a vergonha, vem o vício. Um olhar crítico logo revelará que a esmola é uma grande indústria. Pois muitos dos que pedem esmolas são pessoas aposentadas. Já outras são pessoas saudáveis e capazes para o trabalho. Infelizmente assim como o álcool e as drogas, a esmola vicia, sim, sinhô. A esmola ainda provoca a exploração de crianças, doentes, portadores de deficiências e idosos.

Todavia é bom que se diga também que a falta de trabalho produz e alimenta a prática da esmola. Isto é muito preocupante, pois o trabalho começa a entrar em extinção, como pontuam alguns sociólogos. Entre estes destaco o meu amigo pastor, professor e sociólogo Eliab Barbosa Gomes que tem alertado sobre essa tendência. Se você não sabia, fique sabendo que sem o trabalho não se pode ser feliz. Sem o trabalho há fome e choro. Pois “um homem se humilha se castram seu sonho. Seu sonho é sua vida e vida é trabalho... E sem o seu trabalho o homem não tem honra. E sem a sua honra, se morre, se mata” (Gonzaguinha).

Pois é, muitos se tornam mendigos por causa da falta de trabalho. É por isso que na canção “Vozes da Seca” os autores sugerem quatro ações que podem livrar os seres humanos (os sertanejos, os nordestino) desta prática. A primeira ação é que as autoridades deem serviço ao povo; a segunda é que se contruam barragens; a terceira é que o alimento tenha um preço bom e justo; a quarta é que se criem mais açudes. Lembrem-se de que a água no sertão representa vida e trabalho.

Sendo pretensioso ou não, eu gostaria de confirmar a palavra de Deus na palavra da irmã Bete da Igreja Batista em Bultrins - Olinda – PE. Igreja esta que fiz parte do seu colegiado pastoral por cinco anos. A irmã Bete, depois que ouviu o Padre Reginaldo Veloso VII Fórum Popular de Reflexão Teológica de Bultrins, se expressou assim: “Fico feliz em saber que há pessoas como o senhor, padre, que ajudam a comunidade a se ajudar. Mas me chateio profundamente quando vejo grupos de religiosos que entram em nossa comunidade [na Favela Vila Esperança] para nos trazer cestas básicas. Como se isto resolvesse nossos problemas. Precisamos de grupos interessados em nos ajudar, ensinando-nos uma profissão. Fazendo-nos trabalhadores, e não pedintes.”

Depois de ouvir a Palavra de Deus na palavra dos pobres, representada pela nossa irmã Bete, eu gostaria de terminar este texto citando parte de uma bela canção, que diz: “É! A gente quer viver pleno direito. A gente quer viver todo respeito. A gente quer viver uma nação. A gente quer é ser um cidadão. A gente quer viver uma nação” (Gonzaguinha). Amém?

Pr. Adriel Henrique é Pastor e atualmente na Igreja Batista da Cohab.

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