quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
UM CARNAVAL DEMOCRÁTICO E MULTICULTURAL
Antonino Oliveira Júnior*
Estive na cidade de Bezerros, no domingo de carnaval e me deparei com um carnaval democrático, popular e, acima de tudo, verdadeiramente multicultural, na essência e no pleno significado da palavra.
De cara encontramos uma cidade preparada para a folia, com uma decoração simples, porém, expressiva, seguindo à risca a temática dos papangús, com máscaras gigantescas colocadas nos postes e um povo que esbanjava felicidade e alegria, juntando-se o tempero das orquestras de frevo, dos maracatus e dos demais ritmos e passos do carnaval de Pernambuco. Uma beleza imensa.
As ruas, todas tomadas por foliões animados, na sua maioria, jovens, eram transformadas num imenso salão de carnaval. Uma juventude bonita (ah, Capiba!!! – “...a juventude dourada, na rua que é do povo, camisa aberta no peito...”) envolvida no frevo executado por orquestras que tocavam no chão, Bloco e povo misturados, e mal a gente respirava, lá vinha o maracatu estremecendo as ruas com suas alfaias potentes em seu cortejo de muita concentração e gingado. E o povo misturado, no som do Afoxé que vem logo a seguir, executando seus toques místicos e mostrando a sensualidade dos quadris de suas mulatas e morenas. Como ficar parado? Como não se deixar envolver pela magia daquele carnaval?
Ali, em Bezerros, estava o carnaval na sua essência cultural e na democracia de sua brincadeira. Todos viram brincantes em Bezerros. Nenhum sintoma de briga e nem, sequer, de discussão. Todos estavam ali para brincar o carnaval e Reboleixon (escrevo assim de propósito), nem de longe. Por um momento pensei: Será que esses jovens não são jovens? Por que não estão dançando o reboleixon? E a resposta veio logo, sem titubear: É porque ali, no carnaval de Bezerros o carnaval é uma festa de carnaval, e se é em Pernambuco, é pernambucano, sem qualquer preconceito. Não vi um jovem sequer (menino ou menina) reclamar a falta do reboleixon, justamente porque não lhes faltavam os ritmos do carnaval de Pernambuco, o contagiante frevo-de-rua, o lirirsmo do frevo-de-blocos, o charme dos passos do caboclinho, a sensualidade e a seriedade dos ritmos afros. Lembrei de Olinda, no início da década de 70 (do século passado), quando aquela cidade fez escola, tirando o carnaval dos guetos dos Salões dos Clubes, que abrigavam os ricos e classe média para que brincassem um carnaval sem misturas. Olinda democratizou o carnaval, num momento em que o próprio país não podia ser democrático. O carnaval foi para as ruas (Ah, Michilles – “...e a folia explodiu no ar!!!”)
Bezerros foi palco do carnaval da juventude dourada, dos coroas que a idade lhes dava apenas a opção de frevar da cintura para cima, dos casais fantasiados trocando beijos e ternura. Vi criancinhas (dentre elas a minha neta Camila), pulando, frevando, sorrindo, como quem dizia para o restante: o carnaval de Pernambuco está salvo! Era um carnaval de povo feliz, dentro e fora dos Blocos, uma alegria sem tempo (nem novo e nem velho). Era apenas a alegria do carnaval do povo. Um carnaval de todos, para todos.
E, justiça se faça, aquele carnaval participação que vi em Bezerros, não é fruto de contenção de gastos, não acontece daquela maneira porque o Prefeito “cortou” 40 ou 50 por cento dos recursos que se pretendia. Ali é uma concepção acertada do que seja o carnaval, do que ele representa para a cultura do povo. É a maior manifestação cultural do país. Tem que ser respeitada. Tem que ser um projeto sério, para que a iniciativa privada venha a investir, formando parceria com o Poder Público. Aquele carnaval é uma decisão política (por favor, articuladores de plantão, não falo de Partidos Políticos e muito menos das atitudes mesquinhas) em tornar o carnaval da cidade um patrimônio cultural da população e que as brincadeiras sejam respeitadas como um bem público. Olinda e Bezerros são, verdadeiramente, exemplos de carnaval democrático e multicultural.
PS: Sou fã do carnaval de Recife, mas, acho um equívoco promover shows com Zeca Baleiro, Maria Rita, Fernanda Abreu, Arnaldo Antunes, etc., todos reconhecidamente muito bons, mas, que nada têm a ver com o carnaval de Pernambuco. Este, sim, por si só, já é multicultural.
*Antonino Oliveira Júnior é membro da Academia Cabense de Letras
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