Douglas Menezes*
O cogumelo parece sair das entranhas da terra. Como um deus sentenciando
a todos. A rosa que o poeta falou: sem cor, sem brilho, sem cheiro, fabricando
um jardim disforme, florido de flamejantes flores do inferno. A floresta do mal
enegrecida pela intolerância do império. A história sempre foi assim: o poder
não tem sentimentos. Não precisa de justificativa, a existência é feita de paradoxos:
há vida, porque há morte. Na ação, todos os inocentes são culpados.
Hiroshima não foi diferente. Hiroshima não é diferente. Ficou o mundo
sob o domínio do medo. Até hoje os nascidos agora refletem o pesadelo. O
argumento é forte: destruir para renascer. Hiroshima não tem amor. Dói muito,
no entanto. Nascemos todos depois, mas é como tivéssemos nascidos antes. Ficar
fazendo parágrafos para relembrar uma data que poderia ter sumido no tempo.
Afinal, foi mais um ato histórico comum.
Porém os eventos de outrora deixam vestígios de destruição, mas são
congelados no passado, mumificam-se com o passar dos séculos. Hiroshima é outra
história: o passado vive no presente e no futuro. Ainda estão nascendo os
frutos daquela árvore: cancerosos, acéfalos, anencéfalos, mal pensantes,
raquíticos, cegos e surdos. Hiroshima Meu Amor, a paz que reencontra o medo, o
trauma, a vivência que não apaga da memória o horror. Templo nenhum que console
os que surgiram pranteando aquele momento, que insiste em viver. Há mais de
seis décadas Hiroshima foi o recado dado ao mundo: há sempre um rei em todos os
tempos, e essa história imutável carrega o barco da humanidade de uma
esperança que deve ser a última a
morrer, sem sabermos quando.
Que se tenha em mente a necessidade de
reviver. O esquecimento pode incentivar a repetição, pois eles se multiplicam
como a Hidra de Lerna, da mitologia para os dias de hoje. E o dilúvio que
destruiu um tempo nas águas da ira de Deus, poderá retornar trazendo não a
força da enxurrada líquida, mas a luz
incandescente e envenenada do cogumelo do mal. Hiroshima, Hiroshima ....
7 de agosto de 2013
*Douglas Menezes é da Academia Cabense de Letras.
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