quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
PROGRESSO X DESENVOLVIMENTO
PROGRESSO X DESENVOLVIMENTO
Antonino Oliveira Júnior*
Não restam dúvidas de que o progresso chegou paras as cidades diretamente ligadas ao Complexo Portuário e Industrial de Suape. O Cabo de Santo Agostinho possui hoje uma invejável situação econômica e financeira (comenta-se em cerca de 40 milhões/mês), que a coloca no topo da relação das maiores arrecadações do Estado, o que possibilita ao seu governante planejar e executar ações que beneficiem a população.
Assim, não é difícil se ver as inúmeras placas de Obras anunciando milhões em asfaltamento de ruas, aberturas de avenidas, etc., e até construindo escolas e Postos Médicos, na maioria das vezes em parceria com os governos estadual e federal. É o progresso chegando e enchendo a cidade de concreto e asfalto, que são necessários, claro, para que o povo deixe de pisar na lama e possa ter uma cidade que cresce aos olhos de todos. Empregos, então, aparecem em abundância diariamente, ainda que falte a capacitação da mão-de-obra. O comércio aquecido e a onda de anúncios de “invasão” de trabalhadores vindos de outras regiões levam os aluguéis de casas e até de pequenos quartos para além do racional. Dinheiro atrai dinheiro, diz a máxima capitalista. E é assim que a cabeça da população está funcionando, embriagada pelos sonhos de mudar de camada social num estalar de dedos. Tudo, enfim, no Cabo de Santo Agostinho, cheira a dinheiro. É o progresso chegando com força total, com a força imperiosa do capital.
Se com a chegada do progresso os cofres do governo municipal estão abarrotados de dinheiro, na cidade a qualidade de vida chega próximo ao insustentável. Trânsito louco e ameaçador, ar poluído, ruas barulhentas, o individualismo sobrepondo-se ao coletivo, violência desenfreada, sossego inexistente, famílias despedaçando-se pelo estresse adquirido na monstruosidade dos dias de busca do aumento das finanças. Filhos criam-se praticamente sozinhos, aumentando o risco do desequilíbrio que leva às drogas, ao alcoolismo, ao mundo marginal.
É preciso que o desenvolvimento chegue junto com o progresso, trazendo melhores condições de vida para a população, humanizando a cidade, criando condições para que o dinheiro que chega venha para gerar felicidade para os moradores. É chegado o momento de pensar menos em obras de concreto e de pensar mais num plano de revitalização da cidade, a partir do bem estar da população, criando mecanismos que favoreçam uma melhor qualidade de vida para ela. No Cabo de Santo Agostinho está se tornando impossível que as famílias possam conversar à noite, trocar idéias sobre o dia de trabalho, brincar com os filhos, cumprimentarem os vizinhos, assistir televisão com o som em altura normal, ler um livro; chegar no fim-de-semana e ir com as crianças a uma praça e ler o jornal enquanto elas brincam, não sentir tanto medo de assaltos, não se assustar tanto com o barulho das motos dirigidas por motoqueiros tresloucados (com exceções, claro), viver uma vida de humano, enfim.
As nossas praias, em especial Gaibu, um dia conhecida como “a suave curva do paraíso”, foi transformada numa imensa favela à beira-mar, perdendo aquele encantamento de outros tempos. Ali estão instalados diversos pontos de venda e distribuição de crack e outras drogas. A maioria das pousadas foi transformada em alojamento de operários das empresas que trabalham em Suape. As outras praias são, igualmente, um emaranhado de casas construídas de qualquer maneira e sem planejamento, Com exceção, é lógico, da praia do Paiva, que possui um projeto próprio dos empresários, voltado para um público muito distante da nossa realidade.
Mais do que nunca, é fundamental, é urgente repensar a cidade, estimulando o gosto pelo desenvolvimento intelectual (não confundir em criar doutores), construindo Bibliotecas decentes, as escolas devem ser bonitas, claro, mas, abrigarem programas que estimulem nas crianças e adolescentes o bom hábito pelas artes e pelas letras. Não com a preocupação de formar artistas, que poderão até surgirem de forma espontânea, mas, em especial, construir uma geração que assista teatro, dança, cinema, que sinta interesse em ver uma exposição de artes plásticas, em visitar um museu. Que essas crianças e adolescentes tenham nas escolas um corpo docente formado por professores menos angustiados, melhor remunerados, que estejam capacitados para ensinar com alegria. Professores que gostem de ler e passem isso aos seus alunos. É mais do que urgente que a cultura e a arte sejam definidas como uma das prioridades de governo, ainda que não se destine a essas ações orçamentos mais generosos em termos de dinheiro. Mas, é necessário que o governo municipal tome a decisão política de priorizar a cultura como meio de promover a humanização da cidade e das pessoas, criando espaços públicos para o desenvolvimento cultural dos artistas e da população. Os artistas e intelectuais do Cabo de Santo Agostinho respiram com dificuldade e armazenam, não se sabe como, oxigênio suficiente para resistirem. É uma cidade que tem uma Associação de Teatro, uma Academia de Letras, uma infinidade de músicos, cantores, escultores, pintores, etc., faltando, apenas, quem se disponha a sentar com eles para repensar ações para a cidade. Por outro lado, sente-se a necessidade de ouvir importantes setores da sociedade e discutir como adaptar a cidade à nova realidade que a cerca, levando em consideração o meio-ambiente, a cultura, a educação, o transporte, o lazer, o patrimônio histórico, que vive desprezado e relegado à condição de “coisa velha”.
Muito dinheiro chegando e uma corrida desenfreada atrás de um tesouro que não consegue assegurar felicidade. Não é correto que nos acostumemos a uma vida que pouco tem de vida. É preciso repensar a cidade. Sem exclusões, de coração e mente desarmados, num imenso e intenso mutirão em favor da humanização e da revitalização da cidade, sem ranços políticos, mas, com a consciência de que, a cada dia, o povo perde a sua identidade e que, uma vez consolidada essa perda de identidade, seremos “uma cidade tão pobre que só tem dinheiro”.
*Antonino Oliveira Júnior é da Academia Cabense de Letras.
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Caro Antonino, planejamento nunca esteve entre as prioridades do poder público no Brasil. Quando Juscelino conseguiu implantar Brasília, através do fantástico projeto de Niemayer e Lúcio Costa, paulatinamente, govermo após governo, o prejeto foi indo às favas. Concessões aqui, demagogia ali, falta de um planejamento de habitação e ocupação do solo...Tudo isso resultou nessa imensa bagunça que é, não apenas Brasília, mas todo o nosso país. Sinto demais castrar a sua esperança, mas a história mostra que tudo será igualzinho no Cabo de Santo Agostinho. Ou seria, tudo como d'antes no quartel de Abrantes? Tanto faz, as duas rimam.
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