Douglas Menezes*
O que há de comum entre Théo
Silva, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Raul Pompeia e Manuel bandeira, só
para citar esses? A visão, muitas vezes, amarga da infância, o desencanto
expresso em forma de reminiscências. A
mostra maior de que a primeira idade nunca foi um momento cor de rosa que
alguns insistem em pintar. A melancolia de um período que marca com a dor e os
traumas que virão depois, que acompanharão o adulto para sempre.
Mas essa visão traumática e realista atesta a grandeza desses
escritores. É a vida observada como consequência da soma de experiências que
começam cedo. A tristeza de ver seus passos tolhidos precocemente, os sonhos
tornando-se realidade frustrante.
Então, adulto já, a voz da desilusão com a existência: “Vamos saber
sentir a dor que nos maltrata / A dor que mata lentamente o riso / de todo orgulho
banal de viver/ Porque tudo na vida é
falível / E tudo passa nesse mundo de ilusão e sofrer”.
Como Théo Silva se aproxima de Manuel bandeira no seu poema “Meu Natal
de Ontem e Meu Natal de Hoje”, na linguagem simples, na expressão narrativa do
texto, na tristeza nítida, sem ornamentos romantizados e trazendo a angústia
sincera de mostrar já um mundo despoetizado da infância, onde os meninos pobres
apenas sonhavam, sem ter: “Mas infelizmente eu fui criado na rede encardida da
necessidade / Nunca tive mais que um tostão no bolso em dia de festa / Nunca
ouvi falar num presente de natal / A única coisa que me contentava na vida /
Era ter, todo ano na festa de São Sebastião, uma roupinha nova
de marujo, mal feita”.
Théo Silva viveu no Cabo, nasceu no Cabo, terra dos canaviais, do cheiro
de cana, do doce que era amargo para os meninos pobres, a maioria. E o adulto atestou isso. Num de seus poemas a
lembrança que nos traz da criança num momento de peraltice. Na igreja abriu a
caixinha de hóstia e comeu cinco, fato que o marcou profundamente já como adulto.
A primeira idade estigmatizando o homem
feito. A hóstia, no poema Superstição, não
trouxe a bênção sagrada, mas a certeza
de que as dores ao longo da vida é reflexo dos primeiros momentos infantis: “
Quem sabe se não foi aquilo / E parece mesmo verdade / Porque a felicidade /
Vive correndo de mim”.
A obra de Théo Silva possui a marca trágica de um caminho que a
Literatura dos grandes escritores procura expressar. Obra potente marcada por
uma desilusão, um desencanto que parece ser algo individual, mas, na verdade,
demonstra universalidade. Essa busca incessante de felicidade que o homem
carrega no seu interior em qualquer lugar do planeta e que, não raras vezes, se
transforma num processo de sofrimento e decadência até o final da vida: “O
destino jogou-me na rua da vida / E a vida amparou-me nos braços / A ilusão se
fez a minha amante trágica / E eu morri
para tudo quanto foi amor”.
É importante também citar, dentro da poesia de Théo Silva, a musicalidade,
a sonoridade Neosimbolista, o ritmo a serviço de uma visão solitária sobre a
humanidade, a onomatopeia que lembra uma cantiga infantil, porém com o sopro da
amargura adulta: “Blim blão...blim blão /
Quem é que não tem na vida o sino da solidão / O badalar dentro d’alma /
Quando morre uma ilusão? / Blim blão, blim blão”.
Por fim, insistamos no aspecto
que achamos norteador da obra do poeta Théo Silva: a infância como combustível
para uma poesia cercada pelo pessimismo, solidão e um destino fatalista que parece
ser o de final trágico da humanidade: “Quem não conhece a história / Dessa velha que pediu, / Quando caiu na
fogueira / ‘Bota água meu netinho’ / Mas a criança se esconde/ ( Se ia morrer
na grelha!? / Pois assim é meu destino / Peço
água, ele responde / Igual àquele
menino: ‘ Azeite, senhora velha’ “.
Douglas Menezes, ano da graça de 2013, 6 de agosto